Os “poréns” da coisa toda

Devaneios de uma leitora compulsiva




É um misto de vazio, tristeza, raiva e reflexão. Todos têm uma única certeza após o nascimento: a morte. E como agimos diante disso? Não temos como agir, é inevitável para qualquer um. Temos como agir em vida. E o que fazemos? Nada. É. Não fazemos absolutamente nada, vivemos como se fôssemos seres eternos. Sinto-me triste e ao mesmo tempo com raiva, desperdiçamos tanto tempo nos preocupando com o que não podemos mudar e com ações que, por obrigatoriedade, deveriam ser mudadas. O fato é que ninguém pensa a todo o momento que vai morrer, ainda bem. Mas pensamos na vida, por que não vivê-la da melhor forma possível e no presente do indicativo? “Por isso, por aquilo, se isso, se aquilo”, sempre tem um “porém” que atravanca tudo, mas, “porém” nenhum atravanca a morte, principalmente a morte em vida. Deixamo-nos morrer aos poucos, quando desistimos de nossos sonhos, quando fechamos os olhos para as injustiças, quando, na correria do dia-a-dia, deixamos de olhar para o lado, observar a natureza, sorrir para alguém em um gesto de carinho, quando deixamos de fazer o bem para o outro e para nós mesmos... Somos um pouco (ou muito) responsáveis pela nossa morte.
Obrigamo-nos a certas coisas. O que nos obriga? Não sei. Somos impelidos a ações pouco ou nada condizentes com nossos sonhos, por necessidade ou conveniência, mas é tão difícil sentir-se assim, impotente. É como se tudo fizesse sentido ao mesmo tempo em que parece sem lógica. Por que viver para morrer? Ou morremos para viver novamente? Tudo é repleto de indagações, impossíveis de serem fechadas em um ciclo perfeito, pois a vida não é um ciclo perfeito, ela deixa espaços em muitos sentidos e somos nós os responsáveis por escolhermos onde o espaço será deixado.
A maioria dessas reflexões veio à tona após eu ter lido “A culpa é das estrelas” de John Green. Destaco, no momento, dois trechos:
“Alguns infinitos são maiores que outros… Há dias, muitos deles, em que fico zangada com o tamanho do meu conjunto ilimitado.”
“As marcas que os seres humanos deixam são, com frequência, cicatrizes.”
Se nosso infinito é limitado, por que nos abstemos a marcar o mundo com cicatrizes, vivemos com nossas mágoas e produzimos mágoas. Sim, somos seres humanos imperfeitos em sua missão milenar de evoluir espiritualmente, mas por que a cumprimos em passos tão lentos e inexpressivos? No livro, os personagens sabem que “aparentemente, o mundo não é uma fábrica de realização de desejos”, como o autor coloca. E não é mesmo, mas eles, em seu infinito temporário e instável, realizaram desejos um do outro, “se fizeram felizes”. Isso falta para as pessoas, não só ser feliz, mas fazer feliz.
É fictício, eu sei. Também sei que não posso sair por aí realizando desejos alheios, visto que não consigo nem mesmo realizar todos os meus e isso me deixa frustrada. Se somos incapacitados de realizar todos os grandes desejos de quem amamos, pelo menos devemos tentar ser para o outro o nosso melhor, fazer de quem convive conosco um ser melhor por conviver conosco, por saber que estamos presentes de forma completa, sem medo de se doar e ser feliz. Se vivemos relativamente pouco, por que não nos é permitido mais? Ou, o que não nos deixa permitir mais? Uma resposta minha para isso é que vivemos mecanicamente, como robôs programados: vamos nascer, crescer, estudar, trabalhar, buscar dinheiro, melhorar de vida (ou não), talvez casar e ter filhos, trabalhar, buscar dinheiro, melhorar de vida (ou não), envelhecer e, bom, o que se segue todos sabem. Não que não seja correto. Mas viver aprisionado ao “buscar dinheiro” não é correto. E, não sei... Mas tenho a leve impressão de que trocamos nossos sonhos pelo “buscar dinheiro”. Não se consegue praticamente nenhum substantivo concreto sem dinheiro, mas a vida é impossível sem sonhos, buscar o equilíbrio é primordial.
Outra frase do Sr. John Green: "Meus pensamentos são estrelas que eu não consigo arrumar em constelações." Parece que encaixa perfeitamente com o que sinto agora. Está tudo dentro de mim como se eu fosse um armário antigo com diversas gavetas, algumas delas organizadas, outras pouco abertas e aquelas que estão uma bagunça total. E temos o péssimo hábito de não arrumar gavetas...

Um comentário

  1. Como eu escrevi ao ler esse livro: a morte não é um spoiler.
    E olha... ele me encheu de reflexões também. Mas a mais profunda delas é: tudo vai passar. Nós, nossos amores, amigos, até mesmo as pessoas de quem não gostamos, todos um dia morrerão. O que realmente fica é a energia que transmitimos, é o amor que damos, são as marcas que deixamos nos corações alheios.

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